sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

O ANO LITÚRGICO





Nota: A palavra "festa", no gráfico, não indica o grau litúrgico da celebração, mas apenas seu sentido genérico.

Chama-se Ano Litúrgico o tempo em que a Igreja celebra todos os feitos salvíficos operados por Deus em Jesus Cristo. "Através do ciclo anual, a Igreja comemora o mistério de Cristo, desde a Encarnação ao dia de Pentecostes e à espera da vinda do Senhor" (NUALC nº 43 e SC nº 102).
Ano Litúrgico é, pois, um tempo repleto de sentido e de simbolismo religioso, de essência pascal, marcando, de maneira solene, o ingresso definitivo de Deus na história humana. É o momento de Deus no tempo, o "kairós" divino na realidade do mundo criado. Tempo, pois, aqui entendido como tempo favorável, "tempo de graça e de salvação", como nos revela o pensamento bíblico (Cf. 2Cor 6,2; Is 49,8a).
As celebrações do Ano Litúrgico não olham apenas para o passado, comemorando-o. Olham também para o futuro, na perspectiva do eterno, e fazem do passado e do futuro um eterno presente, o "hoje" de Deus, pela sacramentabilidade da liturgia (Cf. Sl 2,7; 94(95)7; Lc 4,21; 23,43). Aqui, enfatiza-se então a dimensão escatológica do Ano Litúrgico.
O Ano Litúrgico tem como coração o Mistério Pascal de Cristo, centro vital de todo o seu organismo. Nele palpitam as pulsações do coração de Cristo, enchendo da vitalidade de Deus o corpo da Igreja e a vida dos cristãos.
TEMPO CÓSMICO E VIDA HUMANA
Como sabemos, a comunidade humana vive no tempo, sempre em harmonia com o ano natural ou cósmico, com as mudanças básicas e salutares das quatro estações climáticas. Estas como que dinamizam a vida humana, quebrando-lhe toda possível rotina existencial. A pessoa é, pois, chamada a viver toda a riqueza natural da própria estação cósmica. Na organização da sociedade humana, o ano cósmico é chamado ano calendário ou ano civil. Nele, as pessoas, em consenso universal, desenvolvem as tarefas da atividade humana.
ANO LITÚRGICO E PROJETO DE DEUS
Como a vida humana, no seu aspecto natural, se desenvolve no clima salutar do ano cósmico, assim também a vida cristã, na plena comunhão com Deus, vai viver o projeto do Senhor numa dinâmica litúrgica própria de um ano específico, chamado, como vimos, Ano Litúrgico.
O Ano Litúrgico não deve, porém, ser visto como um concorrente do ano civil, porque, mesmo este, é um dom do Criador. Deus, inserindo-se no tempo, através de Cristo, pela Encarnação, santificou ainda mais o tempo. Por isso, todo o tempo se torna também tempo de salvação.
SIMBOLISMO DO ANO LITÚRGICO

O Ano Litúrgico tem no círculo a sua simbologia mais expressiva, pois o círculo é imagem do eterno, do infinito. Notamos isso, olhando uma circunferência. Ela não tem começo nem fim, pois, nela, o fim é um retorno ao começo. Não, porém, um retorno exaustivo, rotineiro, mas verdadeiramente um começo sempre novo, de vitalidade essencial.
O círculo é, pois, imagem da vida eterna, e a vida eterna, como sabemos, não clama por progresso, visto não existir na eternidade carência, de forma alguma. A vida eterna - podemos afirmar - permanece em constante plenitude.
Cada ano litúrgico, que celebramos e vivemos, deve ser um degrau que subimos rumo à eternidade do Pai. Em outras palavras, deve ser um crescendo cada vez mais vivo rumo à pátria celeste. Celebrar o Ano Litúrgico é como subir a montanha de Deus, não de maneira esportiva, como alpinista, mas como peregrino do Reino, onde, a cada subida, sente-se mais perto de Deus.
RITMO CÓSMICO DO ANO LITÚRGICO
Como se sabe, o ano civil está inteiramente identificado com o ciclo solar, regendo-se pelos ditames das quatro estações, mas marcado também pelo movimento lunar, onde se contam as semanas. Ano, mês e dia, como frações do tempo, aqui se harmonizam, no desenvolvimento da vida humana.
Na datação cósmica do Ano Litúrgico, seguindo a tradição judaica, os cristãos, no Hemisfério Norte, vão escolher, para a celebração anual da Páscoa, o equinócio da primavera, por este ser ponto de equilíbrio, de harmonia, de duração igual da noite e do dia, de equiparação, pois, entre horas de luz e horas de escuridão, momento de surgimento de vida nova na natureza e de renascimento da vida. Além da estação das flores, no Hemisfério Norte há ainda o simbolismo suplementar da lua cheia, dando a entender que, na ressurreição de Cristo, o dia tem vinte e quatro horas de luz.
No Hemisfério Sul, onde vivemos, não estaremos contudo celebrando a Páscoa na primavera, mas no outono, dada a inversão do equinócio nos dois hemisférios. Daí, a polêmica entre estudiosos da liturgia, os quais reclamam uma data universal, fixa, para a Páscoa, não levando em conta a situação lunar, mas a solar. A Igreja está estudando essa problemática que, ao que tudo indica, virá no futuro.
Nota explicativa: A Igreja, hoje, celebra a Páscoa não no dia quatorze do mês de Nisã, isto é, na data da páscoa judaica, como celebravam os cristãos da Ásia Menor e da Síria, mas no domingo seguinte, acabando assim com a controvérsia pascal do século segundo, por determinação do Concílio de Nicéia.
Para a celebração do Natal, a evolução litúrgica vai escolher outro núcleo do ano. Este outro momento é o solstício de inverno, o "dies natalis solis invictus", ou seja, o "dia de nascimento do sol invicto". Isto também no Hemisfério Norte, pois, no Hemisfério Sul, nós nos encontramos em pleno verão. Neste tempo, os dias começam a crescer, e o sol, parecendo exausto e exangue, depois de uma longa marcha anual, renasce vivo e surpreendente.

É neste contexto, do "Sol Invicto", solsticial, que vai aparecer na face da Terra "o verdadeiro Sol Nascente" (Cf. Lc 1,78), isto é, Cristo Jesus Nosso Senhor. Também a antífona da Liturgia das Horas, do dia 24 de dezembro, inspirando-se no Sl 19,5-6, na sua realidade cósmico-histórico-salvífica, vai cantar belamente: "Quando o sol sair, vereis o Rei dos reis que vem do Pai, como o esposo sai da sua câmara nupcial".

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